Entre sem bater...
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quarta-feira, 22 de julho de 2009


Tem quatro teorias de árvore que eu conheço.
Primeira: que arbusto de monturo aguenta mais formiga.
Segunda: que uma planta de borra produz frutos ardentes.
Terceira: nas plantas que vingam por rachaduras lavra um poder mais lúbrico de antros.
Quarta: que há nas árvores avulsas uma assimilação maior de horizontes.

MANOEL DE BARROS

---

Foto: Tom Damatta

como a vida da mata
que renasce das cinzas
o amor em mim
- planta em solo frágil -
também rebrota

---

Trecho do poema DEPOIS DAS QUEIMADAS
(extraido do livro ACERTO DE CONTAS, de Antonio Rezende)
Foto: detalhe de queimada na Chapada Diamantina / Tom Damatta

sábado, 28 de fevereiro de 2009


Sou um sujeito cheio de recantos.
Os desvãos me constam.
Tem hora leio avencas.
Tem hora, Proust.
Ouço aves e beethovens.
Gosto de Bola-Sete e Charles Chaplin.
O dia vai morrer aberto em mim.
MANOEL DE BARROS
---
Foto: gotas em broto de laranjeira / Rezende

Vim da terra vermelha e do cafezal.
As almas penadas, os brejos e as matas virgens
Acompanham-me como o espantalho,
Que é o meu auto-retrato.
Todas as coisas frágeis e pobres
Se parecem comigo.
CÂNDIDO PORTINARI
---
foto: mmm!!! / rezende

sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

AFORISMO


Todos nós estamos na lama,
mas alguns sabem ver as estrelas
OSCAR WILDE

foto: folha orvalada/rezende

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009



muito romântico
meu ponto pacífico
fica no atlântico
PAULO LEMINSKI
---
Foto: chegando em Ilha do Mel / Rezende

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009


Nada vos oferto
além destas mortes
de que me alimento

Caminhos não há
Mas os pés na grama
os inventarão

Aqui se inicia
uma viagem clara
para a encantação

Fonte. flor em fogo,
que é que nos espera
por detrás da noite?

Nada vos sovino:
com a minha incerteza
vos ilumino

FERREIRA GULLAR
---Quarto poema da série "poemas portugueses", do livro A LUTA CORPORAL
Foto: que chama te anima? / rezende

sábado, 27 de dezembro de 2008

cismo na leveza
e me sustento
poema e foto: antonio rezende

COMO ANTIGAMENTE

Viajar pelo Brasil é mergulhar na diversidade cultural. Ainda vou achar tempo para não viver de outra coisa senão disto: andar por este país imenso e tão rico culturalmente registrando peculiaridades do povo e dos lugares. Por enquanto, vou levando com desculpas esfarrapadas. Às vezes passo apressado, mas por onde ando reparo.

Tornou-se ainda mais ensolarada e lúdica aquela manhã de domingo quando a mulher de sombrinha e roupa antiga surgiu de uma esquina e danou a descer pelas acentuadas ladeiras de Ouro Preto - MG. Passinhos curtos e apressados, parecia deslizar sobre o calçamento reluzente.

Confesso que quis muito ver a face da andadeira vestida de acordo com a velha cidade, mas ela só descia e descia e descia, como se atraída por alguma urgência qualquer naquele embalo da controversa força magnética comum às ladeiras de Minas. Pra descer é fácil. Subir é que são elas.

Pensei em gritar um "Ei, das antigas!!!" sem nenhum acanhamento. Mas me contive por imaginar que talvez não fosse entendido por ela ou por quem mais atendesse ao chamamento. Sabe-se lá o que passa na cabeça de gente em manhã ensolarada de domingo na velha Ouro Preto.

Apressei o passo para me aproximar puxando prosa e caprichar num retrato. Mas, pensando no caminho de volta, desisti da empreitada. Resolvi me valer do "zum" de minha surrada máquina fotográfica. Para que afinal inventaram as lentes de aproximação? Fiz a foto e deu no que deu. Não vi a cara da dona da roupa que descia ladeiras como se flutuasse.

Restou aquela vontade danada de saber quem era a mulher da roupa que parecia andar sozinha, de tirar prosa com ela, de trocar um olhar seguro para saber, entre outras coisas, as razões daquele “desfile dominical”. É que depois fiquei sabendo, por informação de outras mulheres também vestidas como antigamente, que a “modelo” em questão não fazia propaganda de nenhum daqueles estúdios fotográficos que faturam dos turistas que queiram fazer fotos em trajes de época em cidades históricas.

Sim, Ouro Preto e outras cidades brasileiras têm estúdios que põem o sujeito bem ao estilo “tempo do ronca”, em fotos muitas vezes instantâneas e até digitais, mas envelhecidas como se saíssem de um velho baú de guardados. Tais estúdios despertam o interesse das pessoas usando modelos que se expõem nas esquinas, como se estivessem noutro tempo, completamente fora da moda atual. A estratégia, claro, é fisgar freguesia. E como funciona.

Mas isso nada tem a ver com o caso da dona que desceu a ladeira em trajes antigos e me despertou interesses. Como me disseram, "Ela é assim mesmo, uai! Todo domingo se veste desta maneira e sai passeando."

Agora tenho mais é que arranjar um desfecho para o texto que já me parece demasiado longo para uma página na Internet. E é justamente nesta hora que me ponho a pensar na necessidade de achar mais tempo para conhecer lugares como Ouro Preto e outras tantas cidades históricas, redescobrindo e registrando peculiaridades do povo e dos lugares do Brasil.

Um dia ainda acho esse tempo. E tomara que com capacidade e paciência para escrever traduzindo sensações como a de querer entender o que se passa na cabeça de alguém que se traja como antigamente e sai a andar como se flutuasse por ruas antigas e íngremes como as de Ouro Preto numa ensolarada e lúdica manhã de domingo.
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ANTONIO REZENDE, da série PROSA PARA FOTOGRAFIA
Publicado originalmente em http://www.claraonline.com.br/

terça-feira, 14 de outubro de 2008


pipa que dança ao sol
sentimento criança
cerol não alcança
LÚCIA SANTOS
poema de UMA GUEIXA PRA BASHÔ
foto: soltando pipa / rezende

sexta-feira, 21 de março de 2008

domingo, 3 de fevereiro de 2008

. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .

Bicho acostumado na toca encega com estrela

MANOEL DE BARROS

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

INÉDITOS DE PESSOA*


Longe de mim em mim existo
A parte de quem sou,
A sombra e o movimento em que consisto


(1920)

Quero, terei-
Se não aqui,
Noutro lugar que inda não sei.
Nada perdi.
Tudo serei.


(1933)


*Poemas extraídos de publicação do escritor Teódolo López Melénez, no site CRONÓPIOS.
Ilustração: CASA FERNANDO PESSOA


quarta-feira, 30 de janeiro de 2008

MORITURO




















AUGUSTO DE CAMPOS
É melhor homem soltar longas palavras
e engolir as que um outro fala
pois não é digno homem de palavra
que ainda por cima reclama
que aquelas que comeu não tinham sal

É melhor homem deixar a fala
e não ter boca
é melhor que alguém, eu mesmo,
repare em sua falta

Não é meu vocábulo
e já estou cheio dos seus
É melhor costurar-lhe os lábios
cortar as suas orelhas sem ouvidos
queimar o seu dicionário

É melhor
que os seus olhos ouçam e falem além disso

GREGORY CORSO
Versão: Décio Pignatari
(Gregory Corso é um dos pesos-pesados da chamada beat generation)

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

HAICAI

orvalho no xaxim
teu olho de chuva
cai sobre mim


LÚCIA SANTOS
(do livro Uma Gueixa pra Basho)
Foto: Tom Damatta

segunda-feira, 28 de janeiro de 2008

poesia não compra sapato
mas como andar sem poesia?

EMMANUEL MARINHO

E AÍ... FIRME?!


Como vão as sandálias
que calças com arte
fivela pra fora da parte
da perna da calça
a única causa
que tens no chão?


---

Trecho de uma cançao de CHICO MARANHÃO
foto: e aí, frime?! / rezende

domingo, 13 de janeiro de 2008

OPUS DEI

Fez Deus mesmo ausente
O Universo.

O reverso dessa obra:
O homem o fez:
O Deus neófito de cada vez.

E dito também nos apócrifos
Que o homem escreveu.
E a Deus o homem Deus
nos deu.

ANTONIO CARLOS ALVIM

Alvim é um dos fundadores da extinta mas "imortal" ACADEMIA DOS PÁRIAS.
Publica poemas aqui de vez em quando

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

se me dôo
não grito


doar não
me deixa aflito


doer:
nosso eterno conflito


GILSON CAVALCANTE

Gilson é poeta e jornalista. Tem uns livros publicados e está com outros engavetados.
poemante@hotmail.com

segunda-feira, 7 de janeiro de 2008

preciso de asas
de xícara
de fada
anjo
ou outra coisa alada


DÉBORA PRADO

Débora arrisca uns versos e escreve neste blog: http://gudvelsignedeg.blogspot.com

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

ADIANTE!!!



a cada manhã
renovo a esperança

palavra por palavra
no amor renasço
e cresço


REZENDE

foto: reflexo de luz da manhã em ponta de broto orvalhado / rezende

domingo, 2 de dezembro de 2007

EU, COM MEUS PRÓPRIOS PÉS DE BARRO


Eu, com meus próprios pés de barro
Cruzava então os continentes assombrados
Inclemente ao clamor dos elementos
Colhia flores para os meus heróis avaros
Meus iguais que dormiam sob a chuva
E nas copas das árvores que eu vergava
Benditos frutos entre sementes vegetando
Ásperos como a voz que os embalava.

Eu, como meus próprios pés de barro
Devastava as antigas tribos insulares
Devorando raízes e mitos sagrados
Congelando e tatuando a alma dos bravos
E dos sábios em moedas de ouro roubadas
Para forjar um país de amotinados.
Esse sonho era minha febre, e eu soprava
Como um deus exasperado sobre os vivos
O sopro que a mim mesmo eu recusava.

Eu, com meus próprios pés de barro
Regia esse escarcéu que me exilava
Mas o que era eu nesse tempo inventado?
O que impedia a queda tão esperada?
Eu queria acordar no meio da tarde
Ouvindo sons de risos ou de flautas
Que aplacassem a lenda onde eu reinava
Que revogasse a pena desses homens
plantas e bichos aos meus pés
Mas o barro do poema me enterrava.

FERNANDO ABREU

quarta-feira, 14 de novembro de 2007

Come ananás, mastiga perdiz.
Teu dia está prestes, burguês.

MAIAKÓVSKI

terça-feira, 13 de novembro de 2007



Grita a vida que se fez
c/alada nos terraços

GILSON CAVALCANTE
poemante@hotmail.com

---

Gilson é poeta tocantinense e tem alguns livros publicados,
entre eles REINVENTÁRIO DA PAISAGEM
(Ensaio da Lógica Antropoética) / Saccada Editora - 1995

sábado, 10 de novembro de 2007

garçom, mais uma dose
coração doendo

de amor e arteriosclerose

PAULO LEMINSKI



Reprodução de um poema do livro ACERTO DE CONTAS, de Antonio Rezende, que faz e declama versos por necessidade e teimosia. O bardo também é chegado em prosa besta (http://lorotaboa.zip.net) e fotografia (www.olhares.com/rezende)

FLUXO

som sobre som
o sol calcifica o ruído da pedra
o sonho permanece intacto


poema do livro ALGUMA TRILHA ALÉM, de EDUARDO JÚLIO.
Eduardo é fotógrafo e
jornalista.

quinta-feira, 8 de novembro de 2007


A ponte
sem água
exibe os
fundos do mar

Vai zio
um ônibus
atrás versa
imagens cotidianas

No foi-se
do sol
a lua
espera a sua vez

E
por acaso
contemplas
a fina tarde
e meus alardes de adeus

GARRONE
raimundogarrone@uol.com.br

Garrone é jornalista, curte estrada e arrisca uns versos.
Foto: panorâmica do Rio Anil na maré baixa em São Luís - MA. / Rezende

quarta-feira, 7 de novembro de 2007

ORAÇÃO PELA AMNÉSIA


talvez
o que me escape
seja o que mais salte
em mim

sabe lá
se o que eu não veja
reze pelos meus cantos
assim seja

portanto
o que me fuja da memória
à revelia
revele minha história

que nem eu saiba mais enfim
se sou eu que ando por aí
em carne osso coração e mente
ou se é meu fantasma demente
rindo de todo mundo
e de mim

FERNANDO ABREU

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Poema do livro Relatos do Escambau
Musicado por Chico César
Foto: um auto-retrato / Rezende
escambau@hotmail.com

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

MANTENHA DISTÂNCIA

A poesia é uma droga alucinatória
mais forte que o LSD e o poder.
Só deve ser usada contra o real.
Causa ao viciado - deliriuns tremens,
desprezo da sociedade & a pena capital.
Perigo. Perigo. Perigo.
Mantenha distância do poema.
Evite o primeiro verso.

LUIS AUGUSTO CASSAS

Poema do livro ROSEBUD, 1990.
Cassas é poeta dos bons e tem um patuá de livros publicados

terça-feira, 30 de outubro de 2007

GILSON CÉSAR

gesto
feição
ou cara

meu verso
é confissão
coisa que se escancara


Palhaço, todo alma e expressão, ele faz mímica como quem
arquiteta versos. Seus gestos são como imã que prendem o
olhar da gente. Este bar dos bardos é fã de seus poemas mudos,
que falam pela explosão do riso do respeitável público.

Poema: Rezende / Foto: Divulgação

segunda-feira, 29 de outubro de 2007


sobressalto

esse desenho abstrado

minha sombra no asfalto

PAULO LEMINSKI

poema do livro LA VIE EN CLOSE; ed. brasiliense / foto: rezende

poste aceso no
saara.

a sombra
sozinha
de uma nuvem

ilhada
no meio da água.

pra você disseram
cuidado
e o tipo de coisa
que você aprende é assim
:
desconfiar do susto. evitar o soluço do assalto.

tomar os remédios antes e perguntar
depois.

pra você disseram
como evitar
sem sair de casa a

solidão (poste aceso no saara. sombra
sozinha
de uma nuvem ilhada
no meio da água.)

e todos os seus
dias agora são assim
:
sol se pondo
sobre os créditos do filme da sessão
da tarde.

óculos escuros em todas as
fotografias do álbum,

dissimulando seus olhos ancestrais,
seus olhos mais
caninos

cravados outrora
na estrela mais nova e mais
solitários

que a morte.

REUBEN DA CUNHA ROCHA

segunda-feira, 8 de outubro de 2007

LUNDI MATIN


le soleil eclaire

l'immensité
du monde

et incendie
mon coeur
vagabond

Tradução de Elisabeth Delquignie para o poema
MANHÃ DE SEGUNDA, de Antonio Rezende

Poema do livro ACERTO DE CONTAS
já publicado no bar dos bardos em 2 de junho de 2007.
Para vê-lo em português clique aqui

sábado, 6 de outubro de 2007

O PARTO

Meu corpo está completo, não o homem – o poeta.
Mas eu quero e é necessário
que me sofra e me solidifique em poeta,
que destrua desde já o supérfluo e o ilusório
e me alucine na essência de mim e das coisas,
para depois, feliz ou sofrido, mas verdadeiro,
trazer-me à tona do poema
com um grito de alarma e de alarde:
ser poeta é duro e dura
e consome toda
uma existência.

NAURO MACHADO
Poema do livro CAMPO SEM BASE

Mais sobre Nauro Machado aqui

sexta-feira, 5 de outubro de 2007


não tenho ofício

poema pra mim
é vício

FERNANDO ABREU

quarta-feira, 3 de outubro de 2007

DISCRIMINAÇÃO

niggers um após o outro vários
spics além de jews cada vez mais
mobsters podiam ser menos
wasps entre tantos
white trashes em excesso inúmeros ou quase
baianos a perder de vista inclusive
cucarachas centenas deles ainda assim
japas aos montes já é demais
turcos
paraíbas
e assim por diante


CELSO BORGES

---

Celso Borges tem vários livros de poemas, entre eles o livro-CD MÚSICA
Foto: no metrô / rezende

quinta-feira, 27 de setembro de 2007

NA ORDEM DO DIA



A chuva se arma em volume azul.
Escorro pelas ruas
meu sentimento blues.

Porque chove,
a água impílicita me comove
e me encharca de poesia.

Motivo vertical
na ordem do dia.


GILSON CAVALCANTE

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Gilson Cavalcante tem alguns livros publicados, entre eles REINVENTÁRIO DA PAISAGEM e POEMAS DA MARGEM ESQUERDA DO RIO DE DENTRO.
gicante@bol.com.br
Foto: na chuva / rezende

quarta-feira, 26 de setembro de 2007


Sou
e não sou
Suo

GARRONE

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Raimundo Garrone é poeta e jornalista.
Mora em São Luís mas "vive" na estrada
Foto: gotas num talo / rezende

AFECÇÃO HABITUAL

verdadeiro ou mentiroso
tímido ou venenoso
estou contigo e ouso
ser dos lados o elo
dos feios o belo

ANTONIO CARLOS ALVIM

Alvim é poeta maranhense

segunda-feira, 24 de setembro de 2007

ISIS


Versos para uma foto de Isis. O trabalho estará no livro
VERSOS PARA FOTOGRAFIAS, a ser publicado brevemente.

Foto e poema: Rezende

terça-feira, 18 de setembro de 2007

SÃO LUÍS EM P&B


Sempre achei que fotografia é o poema que se faz com luz e sombra, a partir da sacação silenciosa do olhar atento.

Divido com vocês a descoberta do site do Anilson, que retrata muito bem a centenária São Luís do Maranhão, em preto e branco.
www.anilson.com.br


sábado, 8 de setembro de 2007


Nada vos oferto
além destas mortes
de que me alimento

Caminhos não há
Mas os pés na grama
os inventarão

Aqui se inicia
uma viagem clara
para a encantação

Fonte. flor em fogo,
que é que nos espera
por detrás da noite?

Nada vos sovino:
com a minha incerteza
vos ilumino

FERREIRA GULLAR

---

Quarto poema da série "poemas portugueses", do livro A LUTA CORPORAL
Foto: que chama te anima? / rezende

quarta-feira, 29 de agosto de 2007

DEMORA DEFINIDA

A poesia em mim
Sendo o que me minta
Nunca tem fim
Sempre foi assim

Tudo em mim ela grita
Nunca foi só escrita
Criou em mim até cripta

Túmulo dentro em mim

Sempre foi assim

A poesia em mim
Sendo o que me minta
Criou dartros na alma
Deixou rastros de alma
Em mim
E de mim

Sempre foi assim

A poesia em mim
Sendo o que me minta
Escreve-se assim:
Poesia até o fim...

ANTONIO CARLOS ALVIM

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

ASSASSINO...


é todo homem que
ao crescer
mata em si o menino


SÉRGIO NATUREZA

ilustração: Chico Caruso

quarta-feira, 22 de agosto de 2007

CONTEMPLO O TEMPO


contemplo o tempo
que já não me sobra
há dentro um templo
só de deuses mortos
de quanta fé fez-se
a ruína dessa obra?

acaso este deserto
que me encara
recebe de volta
outra miragem?

será que a sede
deste agreste
inundará de ventos
meus nordestes

apagando
meus rastros rostos
restos?

eu que já fui rês
pra toda corda
eu que já fui punhal
pra todo cabra
eu que já fui pau
pra toda cobra

o que serei
após esse deslinde?

coisa livre de fim
areia aos montes
disseminando dunas
e baías

finíssima lâmina
a teus pés
se contemplas o mar
e sonhas dissolver-te
nessa esfera

súbito
grão de areia
ao vento
turva a cena
e te desperta

prazer
de me afogar
nesse dilúvio
subatômico
-lágrima irritada
que teu olho verte

FERNANDO ABREU

foto: Rezende

sábado, 18 de agosto de 2007


Sou um sujeito cheio de recantos.
Os desvãos me constam.
Tem hora leio avencas.
Tem hora, Proust.
Ouço aves e beethovens.
Gosto de Bola-Sete e Charles Chaplin.

O dia vai morrer aberto em mim.

MANOEL DE BARROS

---

Foto: gotas em broto de laranjeira / Nikon D50

quinta-feira, 2 de agosto de 2007


Cresce o homem com tudo que cresce
e se acrescenta Pedro com seu rio,
com a árvore que sobe sem falar
por isso minha palavra cresce
e cresce:
vem daquele silêncio com raízes,
dos dias do trigo,
daqueles germes intransferíveis,
da água extensa,
do sol cerrado sem seu consentimento,
dos cavalos suando na chuva.
---
Poema XIII do livro AINDA, de PABLO NERUDA
Foto: Manuel Raphael (http://www.olhares.com/manraphael)

terça-feira, 3 de julho de 2007

Perdão se quando quero
contar minha vida
é terra o que conto.
Esta é a terra.
Cresce em teu sangue
e cresces.
Se se apaga em teu sangue
te apagas.


PABLO NERUDA
---
sexto poema do livro AINDA

domingo, 24 de junho de 2007

Se esse amor
for coisa barata
por favor:
pega o chinelo
e mata.

ANDRÉ GONÇALVES
do blog FARINHADA

sábado, 23 de junho de 2007

CONSULTA


sabe, doutor...
eu vim aqui
pra ver se há cura
pra espasmos de ternura

REZENDE
---
poema do livro ACERTO DE CONTAS

quinta-feira, 21 de junho de 2007


em tua mão destra
meu violino só
vira orquestra

LÚCIA SANTOS

Poema do livro UMA GUEIXA PRA BASHÔ.
Foto encontrada no Google, sem crédito de autor.

O SILÊNCIO DOS POETAS

antes de mim antes de ti
tu és eu sou
os nomes do mundo
o nosso motor

dentro de mim dentro de ti
não sei quem és não sei quem sou
os olhos são outros
é outro o ator

assim, o que eu vejo o que tu vês
não é antes não é depois
é o tempo parado
um sonho além dos dois

um dois três quatro
seguimos olhando um outro retrato
moldura descontínua
comida fora do prato

mas continuamos a falar
um aqui outro lá
da química louca, lugar de outro lugar

e caminhamos enfim
tu contigo eu comigo
procurando cada um o centro do outro
cara a cara o nosso umbigo
- mundo mudo -
construindo a nós mesmos pela segunda vez
tu a ti e eu a mim
tu em ti eu em mim
até que morra um de nós e depois o outro
.
CELSO BORGES
---
Poema escrito a partir de um texto do poeta e semiólogo português Alberto Pimenta. Os trechos em itálico são de sua autoria. Do livro-cd MÚSICA, que mistura poesia e som e reúne cerca de 50 artistas brasileiros. Mais informações: cbpoema@uol.com.br

quinta-feira, 7 de junho de 2007

AGRURAS DA LATA D'ÁGUA



Se nós fosse lata d’água
Nós vivia impariado
Pingando pingos de amor.
E meu deus por funileiro
Com tesoura, brasa e solda
Querendo fazer de nós
Um bonito aguador.
A lata d’água chega no interior
Embalando o querosene.
E na velocidade de Herodes pra Pilatos
Vai mudando de formato.
Agruras da lata d’água
É a própria lata d’água
Falando de sua vida...
E eu que fui injeitada
Só porque era furada.
Me botaram um pau na boca
Sabão grudaram nos furo
Me obrigaram a levar água
Muitas vezes pendurada
Muitas vezes num jumento
Era aquele sofrimento
As juntas enferrujadas
Fiquei com o fundo comido
Quando pensei que tivesse
Minha batalha cumprido
Um remendo me fizeram:
Tome madeira no fundo.
E tome água e leva água...
E tome água e leva água...
Daí nasceu minha mágoa.
O pau da boca caía
Os beiços não resistia.
Me fizeram um troca-troca:
Lá vem o fundo pra boca
Lá vaio pau para o fundo.
Mas que trocado mais sem graça
Na frente de todo mundo.
E tome água e leva água...
E tome água e leva água...
Já quase toda enferrujada
Provei lavagem de porco.
Aí mexeram de novo:
Botaram o pau na bengala.
E assim desconchavada
Me dei areia, cimento
Carreguei muito concreto
Molhado, duro e friento.
Sofri de peitos abertos,
Levei baque, dei topada,
Me amassaram as beirada,
Cortaram minhas entranha,
Lá fui eu assar castanha
Fui por fim escancarada.
Servi de cocho de porco
Servi também de latada.
Se a coisa não complica
Talvez eu seja uma bica
Pela próxima invernada.
É inverno, é chuva, é água
E eu encherei outras latas
Cumprindo minha jornada


JESSIER QUIRINO
---
Foto: bica de cumeeira / rezende

terça-feira, 5 de junho de 2007

ÀS VEZES COM A PESSOA A QUEM AMO

Às vezes com a pessoa a quem amo
Fico cheio de raiva
Por medo de estar só eu dando amor
Sem ser retribuído;
Agora eu penso que não pode haver amor
Sem retribuição, que a paga é certa
De uma forma ou de outra.
(Amei certa pessoa ardentemente
e meu amor não foi correspondido,
mas foi daí que tirei estes cantos.)

WALT WHITMAN ("Folhas de Relva")

sábado, 2 de junho de 2007

MANHÃ DE SEGUNDA


o sol clareia
a imensidão
do mundo

e incendeia
meu coração
vagabundo


REZENDE

---

Poema do livro ACERTO DE CONTAS
Foto: manhã em São Francisco do Sul-SC / rezende

quinta-feira, 17 de maio de 2007


Vim da terra vermelha e do cafezal.
As almas penadas, os brejos e as matas virgens
Acompanham-me como o espantalho,
Que é o meu auto-retrato.
Todas as coisas frágeis e pobres
Se parecem comigo.

CÂNDIDO PORTINARI

---

foto: mmm!!! / rezende

sábado, 12 de maio de 2007


pipa que dança ao sol
sentimento criança
cerol não alcança

LÚCIA SANTOS

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Poema do livro UMA GUEIXA PRA BASHÔ / Editora BABEL
Foto: soltando pipa / rezende

segunda-feira, 7 de maio de 2007

ACERTO DE CONTAS


Acerto de Contas, livro de estréia de Antonio Rezende. Publicado em maio no Salão do Livro do Tocantins, está sendo lançado em várias cidades tocantinenses e em algumas capitais brasileiras. Pedidos pelo email poeme-se@hotmail.com
---
"Se existe uma palavra que possa definir o poeta Rezende, essa palavra é intensidade. Sangüíneo, anatomia louca, todo coração"
(Zeca Baleiro)
---
"O que sustenta a voz firme e hoje mais calejada de Rezende é a consciência plena da grandeza da poesia. E da grandeza do gesto de abraçá-la, para o prazer e para a dor"
(Fernando Abreu)
---
"Rezende é um poeta do coração. Quando lembro dele ou leio algum de seus poemas, é a sua imagem despojada e verdadeira, vazando ternura, que me vem à cabeça"
(Celso Borges)
------

ACERTO DE CONTAS (112 páginas; R$ 20,00)
poeme-se@hotmail.com